São Vicente Pallotti e a
Evangelização com os encarcerados
Nos
anos quarenta, última década de sua vida, Padre Vicente intensificou seu
ministério dando assistência aos prisioneiros, um dos mais difíceis para um
padre. As prisões de Roma, naquela época eram preenchidas com criminosos
comuns, misturados com presos políticos. O ministério entre os prisioneiros,
então era mais difícil do que hoje. Antes de tudo na prisão crescia a
animosidade sectária anticlerical. Os reis eram frequentemente condenados à
morte. Era preciso trabalhar com eles, tentando trazê-los mais perto de Deus
durante os meses de cativeiro, assisti-los na última hora e acompanhá-los para
a forca. Os prisioneiros persistentemente pediam ao capelão para ajudar suas
famílias, para estar perto de seus pais, cônjuges e filhos, e então, como
agora, especialmente os mais pobres caiam nas redes do crime e sofriam as
consequências.
Padre
Vicente em suas visitas às prisões percebeu mais de perto as misérias do mundo,
a ligação entre pobreza e delinquência. Gregório XVI criou escolas de
artesanato para reabilitar prisioneiros jovens para impedi-los de recair no
crime, e Padre Vicente realizou vários cursos de Exercícios espirituais para os
jovens encarcerados da Via Julia e das Termas de Diocleciano. Na década de
quarenta, o próprio Pallotti pediu para cuidar dos presos permanentemente. Ele
foi o primeiro sacerdote a celebrar missa e ouvir confissões no complexo
carcereiro. Em seguida, ele foi chamado pela prisão militar e da casa de correção
em Ripa Grande no Castelo Sant'Angelo. Lá descobriu que não havia uma capela e
obteve das autoridades papais a permissão de adaptar um ambiente para essa
finalidade (OOCCX, p. 19-20).
Quando
desenvolveu o sistema de Procuras, Pallotti assinalou aos cuidados de
prisioneiros a oitavo Procura, sob a proteção de São Bartolomeu. Seus membros
atendiam as necessidades dos prisioneiros em todos os aspectos, incluindo a
assistência espiritual, necessidades físicas, como a alimentação, defesa dos
seus direitos e a busca de arrependimento para o bom comportamento, incluindo o
acompanhamento de advogados e também se preocupava com as famílias dos
prisioneiros. Em 22 de julho de 1845, ele escreveu para à liderança militar
papal para interceder em favor de Louis Berna, um policial jovem que já havia
passado seis meses na cadeia por abandono do dever, em estado de embriaguez,
por visitar sua mãe doente, e em favor de José Belardi, um fuzileiro de 17 anos
que já havia passado cinco meses de prisão, contra o qual Pallotti alegou que
havia uma falsa acusação por três cabos (OCL 5, pp101-2).
Iniciou
também a ser procurado para a dolorosa tarefa de dar assistência sacerdotal aos
condenados à morte. A Confraria da Misericórdia de São João Degolado cuidou dos
condenados à morte em Roma desde o final de 1400. De acordo com seus registros
de pessoas executadas entre 1835 e 1846, Pallotti foi solicitado por nove
prisioneiros condenados que permaneceram impenitentes e, em dois casos, até
mesmo apesar dos esforços dos sacerdotes santos, como Bernard Clausi e Biagio
Valentini. Em sete desses casos, Pallotti teve a alegria de ver a conversão dos
prisioneiros.
É
interessante lembrar que São Vicente não via os prisioneiros apenas como
receptores passivos de caridade e apostolado por outros, mas como tendo o
direito de serem apóstolos ativos na pastoral da Igreja, como é claro a
inclusão nas suas listas de prisioneiros como possíveis membros da União do
Apostolado Católico recém-nascidos, que delineou entre os verões de 1835-1836.
(OOCC IV, p. 182 e 326).
Assim,
cada membro da UAC é chamado a discernir e exercer particulares carismas, é
chamado a uma vida de intensa união com Cristo e proclamar o Evangelho e fazer
conhecer a pessoa de Jesus Cristo. O apostolado se escreve em um contexto de
fraqueza do homem, e por isso vai acompanhado com uma atitude particular de
solidariedade, destacando, em especial, a dimensão da esperança do anúncio
cristão. O anúncio deve ser feito através de experiências de fé que unem
Palavra, Sacramentos e testemunho vivo de caridade, tendo presente que Jesus
tinha predileção pelos pobres. Estes aspectos colocam em evidência como o
ambiente do cárcere é um lugar particular de evangelização.
João
Paulo II durante uma visita à prisão juvenil em Casal do Marmo a 6 de janeiro
de 1980, enfatiza que trabalhar na cadeia "é uma tarefa necessária,
delicada e difícil, que exige um forte compromisso e abnegação", tendo o
cuidado das almas, porque cada pessoa humana, corresponde a um pensamento de
Deus. Nesse sentido, cada ser humano é fundamentalmente bom e feito para a
felicidade, uma vez que a missão de Cristo é dirigida em primeiro lugar para a
interioridade do homem.
O
Cardeal Martini coloca a pergunta do que deve ser feito, na prática, e quais os
caminhos necessitam ser identificados para tratar a dignidade ferida do homem?
Antes de tudo, educar continuamente a comunidade cristã para o fato de que a
dignidade humana é antes de tudo e acima de tudo. Ao se aproximar do preso não
devemos presumir de sermos justos, mas conscientes do nosso pecado, devemos ser
próximos. E' necessário ajudar a pessoa encarcerada a recuperar sua dignidade
por trás de sua máscara, porque há por de trás o rosto do homem, e naquele
rosto há a imagem de Deus e toda a sua dignidade.
Nos últimos
três anos tive a oportunidade de conhecer os rapazes na prisão juvenil na
província de Benevento Airola. Eu estava acompanhada por outras Irmãs e alguns
jovens, para que eles pudessem alcançar e tocar a dura realidade de jovens
acorrentados por seu ego, e de uma sociedade que muitas vezes ilude e
decepciona, mostrando a lei do mais forte. Iniciamos um relacionamento com eles
através da catequese, liturgia, escuta, jogo, oficinas e apresentação teatral.
A experiência com eles me ensinou que cada um de nós é prisioneiro de si mesmo,
no momento em que não conseguimos investigar o potencial, os dons que Deus nos
deu, e que, se não liberarmos o coração através do amor, não seremos capazes de
ver a luz da esperança e da verdadeira liberdade. Ao olhar para o rosto dos
rapazes senti só amor, compaixão, nunca juízo, porque há em cada um a verdade
do próprio ser, que é, aquele de ser Filho de Deus, e irmãos que caminham para
o renascer de uma nova vida.
Sua
estadia lá é um grito de socorro para toda a sociedade, que deve ir ao encontro
de uma humanidade perdida, escrava de seu próprio pecado e de escolhas erradas,
que deve ter no coração o desejo de reconstruir, a partir dessas falhas, para
criar oásis de paz, amor e valores a descobrir e divulgar, para nutrir a fé e a
esperança. E nós, como filhos da Pallotti, sentimos o dever de cooperar na
evangelização deste ambiente, de propor e realizar um trabalho pastoral
orientado para recuperar três valores que expressam a dignidade da pessoa
humana: a consciência, a liberdade, o amor, para que haja recuperação e
inclusão, destes nossos irmãos, que tem necessidade de conhecer e encontrar a
salvação.
Irmã
Anna Simeão CSAC
Ostia
Lido, Roma
Perguntas
para reflexão pessoal e comunitária:
ü
Qual é a nossa atitude em
relação aos presos? Vemos os prisioneiros como nossos irmãos e irmãs, com os
quais Cristo identificou-se de maneira particular?
ü
Rezamos para os prisioneiros, suas famílias, para
aqueles que trabalham nas prisões, para aqueles que têm sido vítimas de crime?
ü
Formas práticas em que podemos nos unir às pessoas no
cárcere, por meio de visitas, cartas, apoiando as famílias dos prisioneiros. De
que forma somos chamados a trabalhar para uma sociedade mais justa e sábia,
consciente, compassiva para abordar as causas da criminalidade?
Oração:
Nós te pedimos ó Cristo, Tu que te identificaste como o último dos teus irmãos e irmãs e que antes da morte experimentaste a amargura da exclusão. Esteja próximo de todos os presos, de suas famílias, daqueles que trabalham nas prisões, vítimas de crime, e fá-los sentir teu infinito amor. Cura as feridas que carregam dentro deles, liberta-os de tudo o que aprisiona seu coração, reaviva sua fé, renova sua esperança, reacende o seu amor, para que possam testemunhar a si mesmo e tornarem-se apóstolos ativos e autênticos do teu Reino de justiça e paz, compaixão e misericórdia, alegria, verdade e vida. Amém.
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